No início do mês passado, em Duque de
Caxias (RJ), o estudante Diego Frazão Torquato, 12, morreu em razão de uma
infecção contraída após cirurgia de apendicite. Um estudo de pesquisadores
brasileiros e britânicos abre uma janela para a redução de mortes causadas por
infecções generalizadas, como a que vitimou o jovem e a modelo
brasileira Mariana Bridi da Costa (foto), no ano passado. O trabalho de pesquisadores da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP, e da Universidade de Glasgow,
no Reino Unido, descobriu o que pode ser a chave para o controle das infecções
generalizadas, conhecidas como sepse.
Após um estudo de dois anos, os
cientistas conseguiram demonstrar que uma proteína existente no próprio
organismo, chamada de citocina IL-33, tem o poder de restabelecer as defesas do
corpo humano a uma infecção generalizada.
A sepse é uma das principais causas de
morte nas unidades de terapia intensiva. "De 30% a 40% das pessoas que
chegam com sepse a um hospital morrem", afirmou o farmacologista José
Carlos Faria Alves Filho, 34, um dos autores do estudo.
A OMS (Organização Mundial da Saúde)
estima em 750 mil os casos de sepse nos EUA por ano, com 200 mil mortes. No
Brasil, sem números oficiais, a USP estima até 20% a mais de mortes.
A sepse ocorre, principalmente, em
razão de falha no sistema imunológico em controlar uma infecção local.
Pacientes com comprometimento do sistema imune, como pessoas com câncer, idosos
ou ainda pessoas saudáveis que foram vítimas de traumas ou queimaduras, por
exemplo, podem se tornar mais suscetíveis.
Descoberta
No organismo humano, quando uma
infecção é detectada, um grupo de moléculas chamadas receptores
"toll-like", que fazem parte do sistema imunológico, entra em ação
para reconhecer o tipo de bactéria que invadiu o corpo.
Em reação em cadeia, esses receptores
ativam os neutrófilos, células que são consideradas os "soldados" da
linha de frente do sistema imune, que migram para o foco da infecção.
Ocorre que, quando há sepse, os mesmos
receptores "toll-like", ao serem ativados na circulação sanguínea,
desenvolvem uma resposta inflamatória sistêmica. Isso, em vez de enviar os
neutrófilos para o combate, inibe a migração dos "soldados" para o
foco da infecção.
"Se você dificulta ou atrapalha a
migração dessas células [neutrófilos] para o foco da infecção, ela deixa de ser
local e passa a ser sistêmica, generalizada", afirmou Alves Filho.
Durante o estudo, os pesquisadores
descobriram que uma proteína existente no próprio sistema imunológico - a
citocina IL-33 -, injetada em doses altas, é capaz de inibir os efeitos nocivos
dos receptores e, com isso, restabelecer a migração de neutrófilos para a
inflamação.
"Essa citocina não tem nenhuma
capacidade microbicida, ela simplesmente fortalece o sistema imune para que ele
próprio consiga controlar a infecção", disse o pesquisador.
Na prática
Os testes foram feitos com camundongos
e amostras de pacientes com sepse, e, segundo Alves Filho, os resultados foram
positivos nos dois casos.
Com os camundongos, a proporção de
animais com sepse que morriam caiu de 80% para 20% após o tratamento com a
citocina IL-33.
Agora, o grupo iniciará duas novas
frentes de trabalho. Uma delas, em Glasgow, para prosseguir com os testes sobre
a possibilidade de uso da citocina de forma farmacológica.
A outra frente deve prosseguir no
Brasil, em busca de uma droga que tenha poderes semelhantes aos encontrados
pelos pesquisadores.
Segundo Fernando Cunha, do Departamento
de Farmacologia da USP de Ribeirão, a droga seria mais viável por envolver
menos custo do que o processamento da citocina.
Cunha disse que a produção de uma droga
leva, em média, de cinco a dez anos até que se encontre a substância ideal.
"Os dados da pesquisa ainda são experimentais, mas a grande vantagem é que
nós já conseguimos demonstrar que o que ocorre no camundongo ocorre também no
paciente. É uma importante etapa já cumprida."
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