IMUNOTERAPIA

1 - IMUNOTERAPIA PARA O TRATAMENTO DO CÂNCER



O tratamento do câncer que promove a estimulação do sistema imuno-lógico, por meio do uso de substâncias modificadoras da resposta biológica, é denominado imunoterapia.

As reações imunológicas podem ser resultado da interação antígeno-anticorpo ou dos mecanismos envolvidos na imunidade mediada por células.

A produção de anticorpos está relacionada com os linfócitos B, enquanto que a imunidade mediada por células se relaciona com os linfócitos T. Os monócitos e os macrófagos também são células efetoras de imunidade e facilitam a atividade dos linfócitos T e de modificadores da resposta biológica, como a interleucina. Mais de setenta atividades biológicas diferentes são mediadas por produtos de linfócitos, monócitos e macrófagos. Esses mediadores podem ser classificados como fatores auxiliares, supressores, reguladores do crescimento e citotóxicos.


Há muito tempo se reconhece a relação entre competência imunológica e evolução favorável da doença maligna. Especificamente, a redução da atividade das células supressoras tem sido demonstrada em pacientes com câncer de ovário, neuroblastoma e carcinoma hepatocelular. Esta observação está mais relacionada à presença de doença avançada do que ao tipo histológico do tumor e também oferece as bases para a imunoterapia de pacientes com câncer, sob a hipótese de que a restauração da função imunológica pode levar a um melhor prognóstico do caso.


Tipos de imunoterapia


A imunoterapia é classificada em ativa e passiva, de acordo com as substâncias utilizadas e os seus mecanismos de ação.


Na imunoterapia ativa, substâncias estimulantes e restauradoras da função imunológica (imunoterapia inespecífica) e as vacinas de células tumorais (imunoterapia específica) são administradas com a finalidade de intensificar a resistência ao crescimento tumoral. A imunoterapia específica pode ser autóloga (a vacina é preparada com material retirado do tumor do próprio paciente) ou heteróloga (vacina preparada com material retirado do tumor de terceiros).


Na imunoterapia passiva ou adotiva, anticorpos antitumorais ou células mononucleares exógenas são administradas, objetivando proporcionar capacidade imunológica de combate a doença.

Indicações da imunoterapia

A imunoterapia ainda é um método experimental, devendo se aguardar resultados mais conclusivos sobre sua eficácia e aplicabilidade clínica. O quadro mostra alguns imunomediadores utilizados em estudos clínicos experimentais e os tumores em que são mais indicados.


Fonte: Controle do Câncer: uma proposta de integração ensino-serviço. 2 ed. rev. atual. - Rio de Janeiro: Pro-Onco. 1993



2 - ANTICORPOS NA TERAPIA CONTRA O CÂNCER

Marco Cesar Cunegundes Guimarães
Doutor em Imunologia Aplicada,
Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro Biomédico, Dept. de Morfologia.
marco.cunegundes@gmail.com
Ian Victor Silva
Doutor em Fisiologia,
Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro Biomédico, Dept. de Morfologia.
Letícia Batista Azevedo Rangel
Doutora em Ciências Biológicas,
Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro Biomédico, Dept. de Morfologia.

RESUMO

Os anticorpos são proteínas plasmáticas relacionadas com a imunidade humoral. Eles foram descobertos no soro de animais que eram tratados com doenças infecciosas por volta de 1890. Após a sua descoberta foram amplamente utilizados em soroterapia contra muitas doenças causadas por bactérias.

No final da década de 1930 a soroterapia foi abandonada por causa da sua toxicidade e do surgimento da penicilina. Alguns avanços biotecnológicos permitiram o desenvolvimento de outra classe de anticorpos, os anticorpos monoclonais, reintroduzindo a imunoterapia a base de anticorpos no tratamento das doenças infecciosas, as genéticas e do câncer. Estes anticorpos obtiveram resultados muito satisfatórios quando proteínas de células tumorais começaram a ser isoladas, sendo usados tanto na terapia como no diagnóstico.

O desenvolvimento dos monoclonais envolve uma série de problemas. Sua produção depende da indução de células tumorais em camundongos e as longas terapias podem fazer com que o organismo sofra com efeitos colaterais indesejáveis, além do elevado custo do tratamento. Por isso, muitos pesquisadores começaram a desenvolver alternativas que visam minimizar os custos e o sofrimento do organismo humano, bem como dos animais envolvidos em sua produção, desenvolvendo anticorpos monoclonais com ferramentas moleculares.

O mercado de biofarmácos relacionado com a produção de anticorpos monoclonais gera muitos bilhões de dólares anualmente, tendo os Estados Unidos como principal ator. No Brasil existem poucas empresas e o mercado ainda se restringe a produção de anticorpos para centros de pesquisa.


INTRODUÇÃO

Anticorpos ou imunoglobulinas são proteínas produzidas por linfócitos B que ocorrem naturalmente como parte do sistema imune adaptativo pelo reconhecimento de antígenos. Anticorpos se fixam em moléculas alvo com alta afinidade e especificidade. Esta característica fez com que pesquisadores desenvolvessem a sua utilização como potente imunoterápico. Desde a sua descoberta, os anticorpos têm sido utilizados como terapêuticos de doenças infecciosas, especialmente bacterianas, como observado inicialmente por Von Bhering e Kitasato em seus estudos com a difteria. A partir daí, inúmeros trabalhos foram realizados com outras bactérias. Estes anticorpos usados em soroterapia eram, inicialmente, anticorpos policlonais. Em meados da década de 1930, com o advento da penicilina e o acúmulo de resultados a respeito dos efeitos indesejáveis de imunoterapias bacterianas, os anticorpos caíram em desuso e foram estritamente utilizados contra toxinas bacterianas. Apesar da sua eficiência na marcação e eliminação de alvos específicos, os anticorpos não eram economicamente atrativos para a indústria farmacêutica, principalmente devido ao seu elevado custo de produção, a sua dificuldade em ser produzido em larga escala, aos efeitos indesejáveis ocasionados pelo constante uso, pela múltipla especificidade de diferentes isotipos existentes no soro. Além disso, problemas com o soro hiperimune incluíam a elevada variação entre lotes, anticorpos com baixa especificidade e riscos na transmissão de doenças infecciosas. Imunoglobulinas comercialmente avaliadas diferiam na sua capacidade de opsonização. Esses problemas motivaram a pesquisa e a produção de anticorpos com especificidade única e em larga escala. Em 1975, a tecnologia de hibridomas foi desenvolvida tornando-se um importante passo para a produção de anticorpos monoclonais, despertando o interesse da indústria farmacêutica. Os anticorpos monoclonais (Mabs) diferem dos policlonais em vários aspectos. Os Mabs são gerados in vitro pela técnica de hibridoma ou de DNA recombinante. Mabs são imunoglobulinas homogêneas que, por definição, reconhecem um epítopo e tem atividade específica mais elevada do que preparações com anticorpos policlonais. Em vias gerais, formulações de Mabs são superiores aos policlonais em relação à homogeneidade, constância, atividade específica e, possivelmente, segurança. Este trabalho visa demonstrar um panorama sobre o histórico do uso de anticorpos usados em terapias contra o câncer e principais problemas associados a essa terapia, além do mecanismo de ação e comercialização.

Terapia do Câncer Baseada em Anticorpos

Anticorpos são componentes críticos do sistema imunológico. Essas proteínas respondem contra patógenos invasores ou outras células e proteínas que o sistema de defesa reconhece como estranhas. Apesar disso, o desenvolvimento e proliferação de tumores pode ocorrer naturalmente em um organismo sem que haja a intervenção de anticorpos nativos do próprio sistema imunológico. Isso acontece porque as proteínas tumorais não são classicamente imunogênicas para o indivíduo. Por esse motivo, pesquisadores desenvolveram o processo de produção de anticorpos monoclonais contra proteínas expressas em células tumorais, com o propósito de marcá-las para a morte. Os anticorpos podem destruir células tumorais por meio da ativação do complemento ou da citotoxidade dependente de anticorpos mediada por células, na qual macrófagos portadores de receptor Fc ou células NK medeiam a destruição, além de bloquearem sinais de crescimento, tais como a formação de novos vasos. Anticorpos específicos para tumor podem ser acoplados a moléculas tóxicas, radioisótopos e drogas antitumorais para promover a destruição desses agentes citotóxicos, especificamente para o tumor. Usando esta técnica, pesquisadores começaram a desenvolver inúmeros trabalhos á medida que proteínas tumorais eram isoladas. No entanto, os Mabs se revelaram moléculas imunogênicas por causa da sua produção em células heterólogas, provocando reações mais severas no organismo, como reações alérgicas, náusea, diarréia, problemas cardíacos e de pele, de acordo com o tempo de utilização terapêutica. Essa característica impediu a liberação nos Estados Unidos, pelo FDA, de muitos processos para avaliação clinica desses anticorpos. Para solucionar esse problema, genes humanos foram fusionados com genes de camundongos para produzir os anticorpos, e dependendo do quanto do Mab é proveniente dos seres humanos, esses são chamados de anticorpos quiméricos ou humanizados. Estes anticorpos possuem a sua imunogenicidade diminuída aumentando as chances da terapia. Além disso, várias dificuldades precisam ser superadas para que o uso de anticorpos em terapia seja efetivo. Uma quantidade suficiente de anticorpos deve atingir o alvo apropriado no tumor antes que sejam eliminados no sangue pelas células fagocíticas portadoras de receptor Fc. As toxinas, drogas e radioisótopos ligados ao anticorpo podem ter efeito sistêmico resultante da circulação através dos tecidos normais. Associados a todos esses problemas ainda se discute nos partidos verdes europeus e na sociedade protetora dos animais, nos Estados Unidos, a utilização de camundongos para produção de Mabs. Por esse motivo existe uma corrida mundial pela produção de anticorpos utilizando ferramentas moleculares que eliminem o estresse animal, as reações indesejáveis e aumente a concentração de anticorpos produzidos. Nesse sentido, com o aumento do conhecimento da estrutura genética dos anticorpos, expressão in vivo e regulação gênica, tem possibilitado a construção de “anticorpos feitos como no organismo humano”, podem ser incluídos os anticorpos quiméricos que representam o primeiro efetor para a redução da imunogenicidade de anticorpos monoclonais heterologos, CDR-enxertados, anticorpos transgênicos e os fragmentos de anticorpos recombinantes. Assim, a partir de diferentes tecnologias, existem hoje no mercado variedades de anticorpos utilizados na terapia de doenças infecciosas, cânceres, transplantes, artrite, entre outras.

Mercado de Anticorpos Terapêuticos

O mercado de anticorpo monoclonal representa o segmento de crescimento mais rápido dentro da indústria farmacêutica. Este setor espera alcançar uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 14% entre 2006-2012, ultrapassando facilmente a taxa de 0,6% de crescimento do mercado de pequenas moléculas. Estima-se que o mercado global de anticorpos terapêuticos gere bilhões de dólares por ano, tendo como principais aplicações terapêuticas o câncer e a artrite, com estimativa comercial de $15 bilhões e $20 bilhões em 2010, respectivamente. Os Estados Unidos é o país com o maior número de empresas atuantes no mercado mundial de produção de anticorpos terapêuticos contra o câncer. Nos últimos seis anos o governo americano autorizou 13 novos Mabs terapêuticos e durante os próximos cinco anos a indústria tem potencial para duplicar esse número. Em 2007, existiam 20 anticorpos monoclonais no mercado americano liberados para uso humano. O mais significativo avanço na aplicação de anticorpos monoclonais na oncologia vem da introdução do bevacizumab (Avastin), de um anticorpo anti-fator de crescimento endolial, e do cetuximab (Erbitux), um anticorpo anti-fator de crescimento epidermal.

CONCLUSÃO

Os anticorpos monoclonais têm sido uma plataforma de sucesso para o mercado de bioterapêuticos, demonstrando alta afinidade, especificidade e baixa toxicidade em relação às drogas clássicas. Avanços tecnológicos no desenvolvimento e produção de Mabs revelam que fragmentos de anticorpos e outras pequenas e menos complexas proteínas tem o potencial de superar muitas desvantagens dos Mabs. O sucesso comercial e terapêutico de anticorpos tais como Rituxan, Avastin e Erbitux, irá reforçar na indústria a necessidade de se estudar a próxima geração de anticorpos terapêuticos. Atualmente, existem mais de 150 companhias que desenvolveram mais de 300 anticorpos para o combate ao câncer e mais de 590 projetos estão em fase de execução. A identificação de marcadores funcionais deverá expandir o número de tumores que podem ser efetivamente “atacados” por anticorpos monoclonais. Portanto, a expectativa é de que o número de anticorpos usados na terapia de diferentes cânceres aumente consideravelmente.


3 - MABTHERA (RITUXIMAB)
“O tratamento dos linfomas de baixo grau estava estagnado há várias décadas, mas recentemente vários estudos têm demonstrado uma importante transformação no que se refere ao tratamento dessa patologia, especialmente com a combinação de rituximab à quimioterapia. O rituximab é um anticorpo monoclonal humanizado contra o antígeno pan B CD-20 utilizado em pacientes portadores de linfomas de baixo grau. Até o momento, alguns estudos com o rituximab demonstraram aumento no tempo de sobrevida, o que é muito difícil neste tipo de tumor. Estes estudos, no entanto, têm tempo de seguimento de 2 a 3 anos e a evolução média da doença é em torno de uma década.

Um estudo multicêntrico conduzido em vários países da Europa comparou a combinação ciclofosfamida, vincristina e prednisona com este mesmo regime acrescido do rituximab em linfomas foliculares. Esse estudo apresenta problemas metodológicos, mas apesar disso mostram um aumento muito interessante na duração da resposta e no intervalo livre de progressão com o uso do rituximab associado à quimioterapia. Mais importante ainda é um estudo de um grupo alemão para linfoma de baixo grau em pacientes com linfomas de células do manto, folecular ou linfoplasmocítico recidivados. Esse foi o primeiro estudo que mostrou um aumento de sobrevida com a adição do rituximab a um regime de fludarabina, ciclofosfamida e mitoxantrona.
A toxicidade do rituximab é mínima; o que temos são alguns efeitos durante a infusão, tais como febre, calafrio, dispnéia e tosse, mas de um modo geral o grau da toxicidade é muito leve e esses efeitos são bem tolerados e vão desaparecendo com as infusões subseqüentes.

Estamos em uma fase de transição no tratamento do câncer, pois no momento em que surgem novas drogas, todo o conhecimento e conduta que tínhamos começam a ser questionados e ao mesmo tempo os novos tratamentos e seus benefícios ainda não estão estabelecidos.” 
Dr. Alexandre José Silva Fenelon
Médico Assistente do Centro de Quimioterapia Antiblástica e Imunoterapia.