Os tratamentos
empregados nos casos de câncer de próstata podem levar à impotência masculina e
sua incidência é proporcional à idade do paciente. Nos indivíduos com 40 anos,
a probabilidade é de 6%; nos de 70, cerca de 70%.
Leia este depoimento
maduro e equilibrado de Dana Jennings, um homem que enfrentou e venceu o câncer
de próstata com a ajuda e a cumplicidade da companheira e que hoje, tentando
superar com dignidade a sequela da disfunção erétil, considera esta condição em
relação aos valores de uma sociedade cada vez mais superficial, materialista e
alheia aos valores da individualidade, na qual temos que conviver sem manual de
sobrevivência.
Venci
o estágio 3 do câncer de próstata – e seu tratamento – em boa forma. Quase dois
anos após descobrir que tinha câncer, sou um homem ativo de 52 anos; exercito-me
regularmente, meus exames de sangue têm os resultados que deveriam ter e meu
oncologista só quer me ver duas vezes por ano.
Mesmo
assim, um efeito colateral de meu tratamento se mostrou particularmente
teimoso: a disfunção erétil. Após uma prostatectomia aberta extrema, radiação e
tratamento com hormônios, é difícil colocar o velho motor do desejo para
funcionar. E agora que estou cuidando de minha depressão pós-tratamento com Zoloft – que também
atrapalha a função sexual –, algumas vezes não consigo nem encontrar minhas
chaves. Ah, e meu nível de testosterona também está baixo.
Apesar
disso, não reclamo. Não há vantagem em estar duro e morto.
O
câncer de próstata e seu tratamento atacam os homens onde eles vivem,
frequentemente causando impotência e incontinência (meu controle da bexiga
voltou gradualmente, mas ainda posso ser pego de surpresa por um espirro inesperado).
Não
que eu esteja pronto para recolher minha tenda. Somos criaturas sexuais, afinal
de contas, e estou trabalhando com meu cirurgião para recuperar aquela parte de
mim mesmo. Nos últimos dois anos, entretanto, insisti em tentar aprender o que
o câncer poderia me ensinar. E aqui estou, apenas tentando entender, tentando
articular como é ser uma mercadoria com defeito em nossa cultura sexualizada.
Nós
nos afundamos numa cultura superficial de sorrisos forçados, falsidades e insinuações.
A insaciável objetificação do corpo – em homens e mulheres – acelera, atingindo
velocidades tão altas que as objeções nem mesmo são ouvidas sob o rugido da
mídia de massas.
Somos
obrigados a cultuar “abdominais de tanquinho” e bíceps altos como o Everest,
seios impossivelmente pontudos e nádegas de titânio. Às vezes, parece que cada
imagem cuspida pela mídia eletrônica ressoa como apenas um assunto nas
entrelinhas, e nada sutil: sexo.
Com tudo
isso, onde fica um homem com disfunção erétil?
Não
estou muito interessado na mecânica biofísica masculina, no Levitra, Viagra e
Cialis (uma ereção que dura mais de quatro horas? Que tal quatro segundos?), em
injeções e bombas penianas.
Para
mim, os comerciais de pílulas mágicas nunca pareceram tocar a nota certa. Os
homens sempre parecem furtivos, como adolescentes comprando preservativos. Mas
a hombridade não diz respeito a feitos prodigiosos ao se fazer amor, ou a
quantos parceiros você consegue satisfazer. Não existem padrões oficiais.
A
verdadeira hombridade trata-se de amor e de ternura. De responsabilidade e de
honra. De trabalhar duro e criar seus filhos da maneira que você acha melhor,
com amor, respeito e disciplina.
Sim,
minha função erétil ainda é um trabalho em desenvolvimento, mas não me sinto
diminuído; não me sinto menos homem. Minha voz ainda é profunda como sempre,
meus olhos são de um azul metálico. Ainda aprecio uma boa cerveja escura, e
posso segurar as pontas numa blitz de segurança (embora às vezes me sinta
tentado a dizer: “Está tudo bem, meninas, sou inofensivo”).
A
libido chega e vai embora nas horas mais estranhas. Porém, curiosamente, sinto
que a vida que minha mulher, Deb, e eu levamos está mais íntima do que nunca.
Eu era aquele que estava doente, mas nós espreitamos o gélido abismo do câncer
juntos. Enquanto eu era esmurrado por diagnóstico, tratamento e consequências,
ela era minha apoiadora, minha confidente, minha incansável enfermeira. E tudo
o que ela fez era recoberto por seu amor por mim.
Era
uma intimidade além das palavras. E, acredite, eu tenho muito a retribuir se
algum dia tiver que cuidar de Deb.
A
verdadeira intimidade não diz respeito exclusivamente à mecânica da carne. É também
o cheiro de um certo xampu no cabelo, um toque casual na cozinha, o gosto de
uma sopa fria de amora num dia quente de verão ou seu coração se derretendo ante
a visão de sua mulher há 28 anos, dormindo profundamente após a meia-noite.
Apesar
de tudo o que aconteceu nos últimos dois anos, sou um homem de sorte. Amo meu
trabalho, sou abençoado com dois filhos adoráveis, e tenho minha mulher gentil
e indispensável para abraçar nestas frias noites de inverno.
O
resto vai se recuperar a seu tempo.
*Dana
Jennings é jornalista do The New York Times e passou por tratamento contra
câncer.
Traduzido
de matéria publicada no New York Times. Editorial pelo autor do blog.
1 Comentário:
Que coisa bonita! Este depoimento é uma prova de que apesar de tudo, dos Obamas, dos Osamas, dos vazíos e dos cheios de sí, ainda existe este sentimento sublime e fantastico chamado amor. Adorei o blog
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