Tenho observado no cotidiano de alguns dos blogs que acompanho, onde seus autores passam ou passaram por situações difíceis diante de doenças graves, que a espontaneidade que brota dessas crônicas, independente dos recursos estilísticos do autor, é muito eficiente em produzir belos efeitos estéticos, abrangentes e duradouros. Soando como alertas, despertando emoções variadas e sentimentos de empatia que estabelecem uma relação de identidade entre quem lê e quem escreve, pode levar à formação de redes de solidariedade, de troca de informações úteis e de experiências. Figure ou não esse “efeito” de forma consciente entre os objetivos de quem escreve.
As palavras são promíscuas e mutantes poderosas. Salvo algumas poucas restrições de gênero, número e grau, elas podem se associar livre e inconseqüentemente para multiplicar seus efeitos. Tenho a presunção de figurar entre seus incontáveis e anônimos amantes traídos. E, como quase todo amante, bom ou não, preocupo-me com seu domínio, seu poder de transformação sobre mim, sobre a sociedade e sobre tudo o que se move. Frias, calculistas; espontâneas, simples, observo-lhes o comportamento individual e coletivo, quando se deixam manipular frivolamente por principiantes ou experientes para formar frases.
Tem também as questões formais, essas coisas de estilo, elegância e tal. Isso, evidentemente, importa para seres, como nós, que acumulamos milênios de civilização.
Mas esse arranjo milimétrico, de precisão quase cirúrgica, inspirado ou não seria preocupação mais afeta aos profissionais, aos estilistas, aos literatos, aos escribas e às suas motivações do espírito ou racionalismo utilitarista. Vargas Llosa, Dostoievsky, Suassuna, Garcia Márquez, Zola, e vai por aí...
Afinal, escrever e publicar posts em um blog de visibilidade mundial supõe a necessidade de relação, empatia, interação visando algum “efeito”, ou retorno, feedback sobre o compartilhar de experiências pessoais, sentimentos ou o que se pensa e se plasma em palavras num dado instante. Portanto, todas as frases, originais ou vulgares são de efeito ou tem potencial de produzir efeito, depende mais de quem as lê, do contexto sociológico, cultural e do efeito almejado. É principalmente por isso que os comentários são tão esperados.
De resto, aos ingênuos que julgam deter alguma forma de exclusividade em sua relação com as palavras, diria que todas as frases são feitas, pois sua matéria prima, as palavras, apesar de todo o seu voluntariado original e significância implícita, ainda não desenvolveram a fantástica capacidade de livre auto-associação. Elas precisam sempre de alguém que as articule, manipule, conjugue.
E para constatarmos tudo isso, basta que leiamos mais, muito mais do que temos lido até aqui, e que, mesmo assim, continuemos a ser humildes ou, por causa disso, passemos a sê-lo.
De outra forma, palavras seriam palavras, nada mais que palavras (olha só que efeitão!) e escrever seria simplesmente um mero exercício solitário, masturbatório, infrutífero.
Tenho recebido dos blogueiros amigos uma carga poderosa de frases de efeitos colaterais, elas são sempre bem-vindas.
Ou então voltemos aos diários de debaixo de travesseiro das mocinhas do início do século passado.
2 Comentários:
Confesso que ainda uso o "diário debaixo do travesseiro". E nele os efeitos das frases são bem mais colaterais que os do blog.
Sim! Gosto muito dos seus textos, Daniel.
Cada vez que lemos ou escrevemos, partilhamos uns das experiências dos outros, em parte é bom, em parte é ruim, pois nos enchemos de alegria e esperanças, e outras vezes nos entristecemos. Mas isso é simplesmente a vida, a realidade, não vivemos num mundo maravilhoso, em que só coisas boas acontecem.
Escrever é libertador, nos faz acreditar que podemos relatar ao mundo o que vai em nosso pensamento, em nossa alma, mas nem sempre somos interpretados corretamente. Muitas vezes pela maneira equivocada com que nos expressamos, por omitirmos detalhes, ou por não sabermos escrever de maneira clara e objetiva o que realmente pensamos, mas estamos vivos, e sempre aprendendo, melhorando a cada dia nossas habilidades em todos os âmbitos da vida.
Não vejo problemas com os diários, só que o objetivo dos blogs, é partilhar experiências, e o dos diários, é registrar nosso dia-a-dia e aprisionar nossas próprias lembranças para nós mesmos. Cada um escolhe o que e como registrar suas memórias.
Abraço
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