Pois bem, estamos em dezembro de 2009 e como naquela canção do Leo Jayme, NADA MUDOU. O Brasil continua sendo o paraíso dos não-leitores.
O mundo sempre teve que conviver com os opostos, os extremos, os contrastes. Alguns são até antagônicos. Alias, do dinamismo resultante desta interação polar é que parece mesmo ser gerada a energia sutil que dá substância ao tecido sociológico, com o qual a civilização costura a sua história ao longo dos tempos, e a propulsiona na direção do futuro. Esta noção dos opostos é antiga e está representada no princípio oriental do Yin e do Yang.
Alguns são de ordem natural como Quente e Frio, Luz e Escuridão, Macho e Fêmea, Norte e Sul, Positivo e Negativo, Botafoguenses e Flamenguistas. Facilmente identificáveis até organolepticamente. Outros surgem como o produto cultural de uma época ou têm origem em um determinado contexto sociocultural, como Gregos e Troianos, Católicos e Protestantes, Peles-vermelhas e Caras-pálidas, Judeus e Muçulmanos, Liberais e Conservadores, Capitalistas e Socialistas (ou trabalhistas?), Paraenses e Amazonenses. A lista de categorias é infinita.
Sou relativamente indiferente a este arranjo, que geralmente envolve ideologias e colorações políticas. Para mim as coisas são bem mais simples: o meu mundinho está dividido primariamente entre leitores e não-leitores e, secundariamente, entre melômanos e não-melômanos. E tudo na vida decorre destas condições do indivíduo.
Os não-leitores são reconhecíveis a milhas de distância e não precisam nem abrir a boca. Eles se sentem à vontade, contextualizados, inocentes, compartilhando com seus pares da inconsciência da inconsciência, pois são a grande maioria em países ainda em desenvolvimento, como o nosso. Os mais bem sucedidos economicamente ostentam geralmente um ar ufano, de propriedade, assim, como quem diria que não se precisa ser minimamente letrado para se fazer dinheiro e oferecer conforto e bem-estar material à família, como se isso fosse o objetivo final da existência. Aliás, em algumas culturas, como a francesa, o livro é tão popular e importante, que ocupa lugar de destaque nos supermercados entre os gêneros alimentícios, os de higiene pessoal e doméstica, os de informática, etc. Lá os livros convivem naturalmente com o arroz, o feijão, o açúcar e o café nos carrinhos de compras.
Mas, afinal, como saber da importância de se ler, se não se leu? Como intuir a existência de uma terceira dimensão, se a experiência da vida se desenrola segundo as leis físicas e a lógica das duas dimensões, apenas? Como no caso das formigas? Como transitar por anos em uma Universidade e mesmo concluir um curso superior, sem desenvolver minimamente o hábito da leitura? Como exercer a cidadania da nacionalidade em sua plenitude e se situar como cidadão em um contexto mais amplo, universal, afirmando uma brasilidade consciente e culturalmente positiva? Não são questões nada fáceis de serem respondidas. Mas certamente devemos fugir das simplificações exageradas.
A escola brasileira não sabe ensinar a ler e ponto — disse o ministro da Educação, Paulo Renato, como se essa declaração explicasse o vergonhoso desempenho de estudantes brasileiros (de escolas públicas e particulares) no tal de PISA — Programa Internacional de Avaliação de Alunos —, colocando o Brasil em último lugar entre os 32 países avaliados quanto à "capacidade de leitura, assimilação e interpretação de texto".
O ministro tentou simplificar demais e transferir para a escola responsabilidades que ainda sequer foram detectadas. Mas cabe a nós retomar o ponto final que o ministro empregou tão indevidamente e transformá-lo em reticências, ou interrogação que iniciem uma reflexão mais aprofundada...
O primeiro ponto a ressaltar é que este resultado confirma a necessidade de enfatizarmos o papel do livro na formação do brasileiro. E isso vai muito além da compra de obras didáticas pelo governo ou a multiplicação de bibliotecas públicas. A leitura é um hábito difícil de formar. Compramos menos livros em 2004 - 289 milhões, incluindo livros didáticos distribuídos pelo governo - do que em 1991.
Uma pesquisa encomendada pelo Instituto Pró-Livro e executada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope), coordenada pelo Observatório do Livro e da Leitura (OLL) constatou que 95 milhões de pessoas, ou seja, 55% da população são leitores, enquanto 77 milhões, 45% dos entrevistados, foram classificados como não-leitores.
O estudo foi aplicado em 5.012 pessoas em 311 municípios de todo o país, de 29 de novembro de 2007 a 14 de dezembro do mesmo ano, o que representou mais de 172 milhões de pessoas, ou seja, 92% da população. O método adotado para definir o leitor ou não-leitor foi a declaração do entrevistado de ter lido ao menos um livro nos últimos três meses.
Quem disse que o jovem brasileiro não lê? Mas não lê o quê? Não lê Machado de Assis e Alcântara Machado? Fernando Pessoa? E o fenômeno Harry Potter? Será tão difícil perceber que os jovens gostam de ler boas histórias - e aí não há livro de 500 páginas que assuste?
Pois bem, esta pesquisa revelou também que no Brasil as crianças e adolescentes ainda lêem mais que os adultos. O que não deixa de ser muito alentador para o presente e alvissareiro para o futuro. A média é de 8,5 livros para a faixa etária de 11 a 13 anos e 4,2 para adultos, de 30 a 39.
Este interesse continuaria se os adultos fossem vistos lendo e comprassem livros para seus filhos. Sentassem com eles e pedissem sua opinião sobre o que leram e o que mais gostaram. Enfim, se os pais demonstrassem para os filhos que ler um bom livro pode dar mais prazer do que ficar passivamente diante da televisão limitando-se a ver e a ouvir o que os outros filtraram, ou jogando videogame o tempo todo.
1 Comentário:
Agora imagine o Brasil, onde falamos uma das linguas mais ricas, com um vocabulário cheio de sinônimos, que nos dá as nuanças que nos permite expressar com exatidão a nossa idéia, nossos sentimentos os mais complexos...Um Portugues reduzido ãs conveniências e à lei do menor esforço dos preguiçosos. Acabo me irritando qdo esse assunto vem à tona.E depois nós é que somos metidos a besta ou frescos quando usamos uma palavra que não é de uso corrente mas que se ajusta melhor à expressão do nosso pensamento.Abs
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