sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

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A lenda do Açaí.

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Há muito tempo atrás vivia na região onde viria a ser fundada a grande Capitania de Santa Maria de Belém do Grão Pará, uma tribo indígena numerosa que sofria com um longo período de escassez de alimentos. 

Passando por uma estiagem rigorosa, a terra estava desolada e ressequida por Guaracy, o sol, e as plantações de mandioca, milho e macaxeira estavam lastimavelmente perdidas, pois há várias luas não chovia. A caça esfomeada se havia mudado para outra região. Rios e lagos, quase secos, pareciam estar estéreis de peixes. O tempo se arrastava lentamente e ficava cada vez mais difícil obter comida suficiente para todos.

Esgotadas todas as reservas de mantimentos e tomadas todas as possíveis medidas paliativas, o cacique Itaki, já em desespero, resolveu que todas as crianças nascidas a partir daquele dia teriam que ser sacrificadas para evitar o aumento da população. E nem sua filha, Iaçã, quando deu à luz uma linda menina, escapou da cruel decisão de seu pai e teve o bebê arrancado de seus braços para ser sacrificado.
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 Inconsolável e consumida pela dor e o desespero, Iaçã implorou ao deus Tupã que mostrasse ao cacique outra solução para o problema da fome, que não significasse a morte para os inocentes recém-nascidos.

Certa noite, transcorridas pouco mais de vinte luas, e quando Jaci, a lua nova, prateava as coberturas de palha das ocas e o vento zumbia suavemente por entre as palmas das palmeiras, Iaçã, que ainda pranteava sua filha, ouviu claramente um choro de criança. Aproximou-se lentamente da porta de sua oca e vislumbrou como em um sonho a imagem de sua filha, de pé – sim, era ela, lá estava o sinal de lua crescente em seu ombro direito! - ao pé de uma grande e elegante palmeira que ficava destacada das outras, às margens do igarapé agora quase todo seco.
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Com o coração batendo com força e sufocada de felicidade correu em sua direção e a abraçou, com os olhos cheios de lágrimas. Mas, para sua tristeza, da mesma e misteriosa forma como havia surgido, sua filha desapareceu silenciosamente entre seus braços.

Cedo, na manhã do dia seguinte, algumas pessoas que foram pegar água no igarapé encontraram Iaçã morta, ajoelhada e abraçada, rosto carinhosamente colado ao tronco da palmeira. Em sua face, no entanto, serena, podia-se ver um lindo sorriso de felicidade, enquanto seus olhos se mantinham fixos no alto da palmeira, que estava carregada de cachos com pequenos frutos esféricos, violáceos, quase negros.

Por determinação do cacique Itaki os cachos foram colhidos e debulhados. Com a polpa extraída dos frutos e misturada com água, ele preparou então uma beberagem espessa e avermelhada, com um aroma delicioso, a qual chamou de açaí (Iaçã, de traz para frente), em homenagem a filha morta.

Com este alimento, matou a fome de seu povo e, neste mesmo dia, suspendeu os sacrifícios dos recém-nascidos. Tupã havia atendido as súplicas de Iaçã e surgia assim o açaí e sua reconhecida propriedade de sanar a fome.

E desde então o fruto do açaizeiro é conhecido pelos indígenas da Amazônia como iça-iça, a fruta que chora.
* Adaptada de antigas lendas de tradição oral das ilhas do arquipélago do Marajó.
** Com efeito, etimologicamente, a palavra açaí vem do tupi, ïwasa'i, que significa "fruto que chora". Que também é uma referência à Iaçã.
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O açaí (Euterpe oleracea) ou juçara é o fruto da palmeira conhecida como açaizeiro. É uma espécie nativa da região amazônica, sendo atualmente encontrado desta região  até a Bahia. Sua altura varia de 20 a 25 m, tronco múltiplo (entouceirada), ligeiramente curvo, de 15 a 25 cm de diâmetro. A touceira chega a ter até 25 plantas. As Folhas são grandes, finamente recortadas em tiras, de coloração verde-escura, em número de 10 a 12 contemporâneas, de 2 m de comprimento. Suas Flores são pequenas, agrupadas em grandes cachos pendentes, de coloração amarelada. Os Cachos, em número de 3 a 8 por planta, têm coloração violácea, quase negra quando maduro. A fruta é pequena, arredondada e muito roxa, quase preta, lembrando uma jaboticaba pequena. Tem caroço proporcionalmente grande em relação à polpa. Seu habitat são os locais úmidos da floresta pluvial. Floresce de setembro a janeiro e frutifica de julho a dezembro.

A cabeça ou "palmito" é também muito apreciada, sendo mais utilizada pela indústria de conservas. Os frutos são também avidamente consumidos por várias espécies de pássaros. É palmeira altamente ornamental e muito utilizada em paisagismo na região norte do país. As folhas são usadas para cobertura de casas. As fibras das folhas para tecer chapéus, esteiras e ''rasas'', que são cestas utilizadas como medida-padrão no transporte e comércio da fruta. Os cachos secos são aproveitados como vassouras. Os frutos novos são utilizados no combate aos distúrbios intestinais; as raízes, empregadas como vermífugos; o palmito, em forma de pasta, atua como anti-hemorrágico, quando aplicado após extrações dentárias.
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É um alimento muito importante na dieta dos habitantes do Pará, onde seu consumo remonta aos tempos pré-coloniais. Hoje em dia é cultivado não só na Região Amazônica, mas em diversos outros estados brasileiros, sendo introduzido no resto do mercado nacional durante os anos oitenta e noventa, com modificações no modo de consumo.

Pode ser consumido na forma de bebidas funcionais, doces, geléias e sorvetes. O fruto é colhido subindo-se na palmeira com o auxílio de uma trançado de folha amarrado aos pés – a peconha.

Para ser consumido, deve ser primeiramente despolpado em máquina própria ou amassado manualmente (depois de ficar de molho na água), para que a polpa se solte, e, misturada com água, se transforme em um suco grosso também conhecido como vinho do açaí.

A forma tradicional na Amazônia de tomar o açaí é gelado com farinha de mandioca ou tapioca. Há quem prefira fazer um pirão com farinha e comer com peixe assado ou camarão e mesmo os que preferem o suco com açúcar (ainda assim, bem mais grosso que qualquer suco servido no sudeste). As sementes limpas são muito utilizadas para o artesanato. Quando descartadas, servem como adubo orgânico para plantas.
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Nas demais regiões do Brasil, o açaí é preparado da polpa congelada batida com xarope de guaraná, gerando uma pasta parecida com um sorvete, ocasionalmente adicionando frutas e cereais, o que não é bem visto pelos habitantes da região Norte, que encaram a mistura como um desperdício de açaí.
Posts já publicados no blog sobre o açaí:

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