A confusão começou
quando um painel de especialistas em prevenção que faz recomendações ao governo
americano divulgou uma nova diretriz. Segundo o grupo, mulheres que não
pertencem ao grupo de risco (sem histórico familiar de câncer de mama,
exposição repetida à radiação ou mutação genética específica) devem começar a
fazer mamografia a partir dos 50 anos e repeti-la a cada dois anos. A
recomendação atual é fazer o exame anualmente a partir dos 40.
A partir de que
idade as mulheres devem começar a fazer mamografia? Aos 40 ou aos 50? Essa é
uma das grandes controvérsias recentes da medicina. Na última década, foram
divulgados vários estudos e recomendações conflitantes. Nos últimos dias, a
discussão recomeçou. Os especialistas debateram. E, como sempre, as mulheres
ficaram sem saber em quem acreditar.
O painel concluiu
que nos Estados Unidos há excesso de exames. Isso significa desperdício de
dinheiro e pouco benefício. Os especialistas reconhecem que a mamografia salva
vidas de mulheres na faixa dos 40 anos. Mas, nesse grupo etário, o
custo-benefício é pouco favorável. Nos Estados Unidos, uma morte é evitada a
cada 1.904 mulheres que fazem mamografia dos 40 aos 49 anos. O resultado é um
pouco melhor no grupo de 50 a 59 anos: uma morte é evitada a cada 1.339 pacientes.
O benefício se torna inequívoco na faixa de 60 a 69 anos: uma morte é evitada a
cada 377 pacientes submetidas ao exame.
A mudança proposta
nos Estados Unidos visa combater o excesso de exames, biópsias e
tratamento desnecessários. A justificativa: quando o exame aponta algum sinal
suspeito de tumor maligno, o médico pede uma biópsia. Muitas mulheres sofrem o
desconforto e o stress de se submeter ao procedimento quando na verdade não têm
câncer.
Em outros casos, o
câncer é confirmado. A mulher enfrenta um tratamento agressivo (quimioterapia e
radioterapia) para conter a doença. Acontece que alguns tumores crescem tão
lentamente que – mesmo sem serem combatidos – não matam. Ou seja: a
mulher morre de outra causa antes que o tumor tenha tempo de causar danos.
Tudo isso pode
realmente ocorrer. Mas o que você prefere? Fazer mamografia a partir dos 40
anos e correr o risco de enfrentar uma biópsia desnecessária ou deixar para
fazer o exame apenas depois dos 50 e perder a chance de descobrir o câncer numa
fase inicial?
O hospital
recomenda que as mulheres façam a primeira mamografia entre os 35 e os 40 anos,
apenas para servir de comparação no futuro. Depois dos 40, o exame deve ser
anual. Graças à detecção precoce e ao tratamento adequado, o hospital consegue
curar 78% das pacientes.
O acesso à
mamografia é muito irregular no país. A cobertura de mamografia (índice de
mulheres que conseguem fazer o exame em relação ao universo que deveria ser
atendido) nos Estados brasileiros varia de 23% a 60%, segundo a Federação
Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama).
Desde 2003, o
Instituto Nacional do Câncer recomenda que o exame seja feito a partir dos 50
anos. Mas uma lei sancionada pelo presidente Lula no ano passado garante que
toda mulher a partir de 40 anos possa fazer uma mamografia a cada ano pelo SUS.
A verdade é que o
Brasil não consegue oferecer o exame a todas as mulheres a partir dos 40 anos.
E sequer a todas as mulheres a partir de 50 anos. Não faz sentido, neste
momento, importar as restrições americanas ao exame. Até porque a questão está
longe de atingir um consenso nos Estados Unidos. A Sociedade Americana de
Câncer, por exemplo, informa que vai continuar recomendando que o exame seja
feito anualmente a partir dos 40 anos.
Os críticos do
painel de especialistas americanos dizem que a decisão pode ter sido influenciada
por razões econômicas no momento em que o governo Obama discute a reforma da
saúde nos Estados Unidos e gastos precisam ser cortados. Em alguns momentos da
história recente, o debate sobre mamografia misturou ciência e política, como
lembra o jornal The
Washington Post.
A polêmica
americana tem pouco a ver com o Brasil. Se você tem acesso a mamografia, faça o
exame anualmente a partir dos 40 anos. Encare esse fato como um privilégio
porque, infelizmente, muitas brasileiras não têm essa oportunidade. Quando o
tumor é descoberto já está tão grande que a mamografia se torna desnecessária.
Das cerca de 50 mil brasileiras que receberão o dignóstico de câncer de mama
neste ano, 25% não sobreviverão. Qual a razão de tantas mortes? Há várias. Uma
delas é que o Brasil tem falta de mamografia – não excesso.
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