Quem
costuma acompanhar os “Comentários recentes” aí no side bar, terá lido a troca de
mensagens que começamos Frida e eu, relacionadas ao momento que ela e
seu amigo atravessam, o diagnóstico recente de um linfoma. Tentando ampliar o
âmbito desta troca de informações, decidi postar algumas impressões e responder
algumas perguntas que ela me faz sobre o meu diagnóstico e tratamento, de modo
que todos possam participar e eventualmente se beneficiar de alguma maneira, de
acordo com a proposta do blog.
Frida
(e amigo):
Vocês
estão vivenciando a pior fase da doença, a do diagnóstico, que chega como um
repentino tsunami varrendo tudo o que
havíamos construído na nossa subjetividade, na nossa vida, na nossa relação com
o mundo, deixando um rastro de desespero, sofrimento, um enorme vazio, um sentimento
inimaginável de uma solidão indizível e a insônia das perguntas sem resposta que
martelam impiedosamente, dia após dia. Isso acontece com todo mundo
nessa fase. Não se culpem. Sinto muito, mas vocês não são exceção.
Quisera
eu poder com meras palavras abreviar, fazer com que superem logo este momento
doloroso, tão bem conhecido por aqueles que já passamos por isso. Mas tudo passa,
tudo passa. Na sua infinita misericórdia, Deus dotou a natureza humana da
capacidade de superação. Mas só o tempo e a fé consciente concorrem neste
sentido. Continue se informando, Frida. Além de todas as vantagens, isto
manterá sua mente ocupada. E se você puder leia também os arquivos de blogs
como o meu e de amigos como a Lilian
e o Edson Leite, entre tantos
outros, e constatará por si mesma as mudanças positivas que se foram operando,
com o tempo, no espírito destas pessoas que já superaram o pior desta primeira fase.
Dentro
desta tormenta, seu amigo tem a sorte de contar com alguém como você. Por isso
procure não se desesperar, mantenha a calma e a serenidade. Vejo pelo que escreve
- e como escreve - que tem boa formação escolar, ética e religiosa, e isto será
de grande valia nas suas pesquisas e na tomada de decisões daqui pra frente, se
mantiver a cabeça no lugar. E assim poderá ser mais útil. E conte com a gente,
não se feche sobre si mesma.
Para
lhe dar a precisão que me pediu, ontem fui remexer nas pastas dos meus
primeiros exames, laudos. Hoje, o tempo transcorrido me permite manusear estes
exames, analisa-los com objetividade. Se você acha que isso pode de alguma
forma lhe ajudar, o relatório do exame anatomopatológico emitido pelo Dptº de
Patologia do Hospital de S. Paulo, UNIFESP, emitiu o seguinte laudo:
Diagnóstico: EXÉRESE DE LINFONODO MESENTÉRICO PRÓXIMO AO PÂNCREAS: LINFOMA NÃO-HODGKIN DIFUSO DE PEQUENAS CÉLULAS. Este diagnóstico foi complementado pelo exame imuno-histoquímico, realizado na mesma instituição, que emitiu o seguinte relatório: LINFOMA DE CÉLUAS B MADURAS, FOLICULAR GRAU II.
Com
relação ao tamanho do linfoma, aí vai a transcrição de parte do laudo da
tomografia que fiz em 21.07.2009:
“Observa-se em topografia adjacente ao corpo e cauda do pâncreas, região do mesentério, imagem de processo expansivo sólido, hipoecogênico, de contornos nobulados, medindo 13,4 x 11,5 x 6,4 cm, hipervascularizada ao Power e Collor Doppler (...)."
Hoje,
um diagnóstico de linfoma não é exatamente uma sentença de morte com data para
ser executada. Os pacientes em tratamento podem tranquilamente viver por muito
mais de 10 anos ou mesmo ser curados, contrariando prognósticos. O acúmulo de
informações sistematizadas nos bancos de dados hoje disponíveis, resultado de
décadas de experiência clínica, constituem uma massa crítica importante e
eficaz na orientação da tomada de decisões sobre qual protocolo adotar. A evolução das
pesquisas tem trazido contribuições importantes no tratamento, com novas drogas,
novas associações e novos padrões de conduta consolidados. O transplante de
medula se tornou algo rotineiro
Tenho
um amigo aqui em Manaus, médico oncologista, agora aposentado, que trabalhou
muitos anos com radioterapia no Hospital do Câncer e foi também Secretário de
Saúde do Estado. Por ironia, ele só descobriu que tinha um linfoma deste tipo quando
ele já havia evoluído para o estágio III. Depois de esgotar todos os protocolos
de tratamento na época disponíveis (ainda não existia o Rituximabe, e a Bendamustina até 1990 só estava disponível na Alemanha oriental
e não era ainda empregada no tratamento de LNH), ele passou pelo transplante
autólogo de medula. Já se passaram 16 anos, ele ainda está vivo e vendendo
saúde. Quando recebi o diagnóstico, ele me passou muita serenidade e confiança
nas conversas que tivemos.
Publiquei
aqui no blog um post com um vídeo de uma entrevista com o comediante americano Gene Wilder, que após quase 20 anos de concluído o tratamento
quimioterápico para erradicar um linfoma deste tipo, encontra-se livre da
doença (apesar de seu médico teimar dizendo que ele está apenas em “remissão”).
Casos
como esses, entre tantos outros que você mesma poderá encontrar em suas
pesquisas, servem para demonstrar que a medicina não é uma ciência exata e que a saúde humana não é absolutamente ponderável, mensurável para ser tabulada e convertida em números estatísticos e em prognósticos infaliveis.
Cada ser humano é uma experiência única e seu amigo deve encontrar as pistas para procurar cultivar uma
atitude mental positiva, no que você poderá ajuda-lo, mas terá que acreditar
nisso para poder transmitir segurança. Minha mulher desempenhou um papel
fundamental neste sentido e serei sempre imensamente grato a ela por isso.
Sobre
todos os procedimentos, como medidas de higiene e os cuidados com a alimentação
de quem está em tratamento com quimioterapia, certamente
você terá toda a orientação necessária por parte dos médicos envolvidos no
tratamento, nutricionista, psicólogo, e poderá encontrar alguma coisa útil
concentrada nas guias deste blog, fruto de pesquisas em sites abalizados. Mas, tenho certeza que você se sairá muito bem.
No
meu caso nem cogitamos a conduta Watch
& Wait (observar e aguardar). Sobre o assunto você encontrará
informação atualizada, em post aqui no blog, retirada dos últimos encontros
internacionais de profissionais da hematologia oncológica. Hoje existe consenso
no meio científico de que esta conduta está superada. Leia o máximo sobre o
assunto para decidir com firmeza e convicção.
Sobre
qual protocolo adotar inicialmente no tratamento, certamente o Dr. Carlos
Chiattone, já consultado, diretor da Associação Brasileira de Hematologia e
Hemoterapia e esta médica que você não menciona o nome, poderão discordar em
algum ponto, pois apesar de partirem de uma base científica comum de
conhecimentos, a experiência clínica pessoal nunca será exatamente a mesma.
Eu,
que nunca tive a pretensão de ser médico, mas procurei melhorar minha
compreensão pela necessidade, tenho observado que a conduta médica procura
adotar um protocolo que melhor se adapte ao tipo de linfoma, sua localização, ao
seu estadiamento e também ao estado
geral de saúde do paciente, sua idade e demais fatores envolvidos, sempre
visando maximizar a sobrevida. Assim, quando o paciente ainda é jovem e goza de
boa saúde, a lógica médica recomenda que se inicie com protocolos, digamos, “mais
suaves”, para que se disponha, depois de uma eventual recaída (ou recidiva), de
uma bateria de protocolos progressivamente mais, digamos, “pesados”,
potencialmente mais eficazes, mas também mais agressivos à saúde. Talvez seja
esta a estratégia que a médica tem em mente ao optar inicialmente pelo CVP.
Depois de tudo isso, o transplante
de medula consta como um recurso cada vez mais empregado com sucesso.
Apesar
das sugestões de parentes e amigos, nunca sequer cogitei sair de minha cidade
para me tratar em S. Paulo, por exemplo. Desde o início fiquei convencido de
que o tratamento a mim proposto, o protocolo R-chop,
era o melhor disponível para o meu caso, naquele momento, e seria aplicável em
qualquer lugar do mundo.
Mesmo
sem me considerar exemplar, vivo hoje a minha vida sem pensar muito nessa
possibilidade de recidiva. Trabalho normalmente e procuro me distrair com os
prazeres mais acessíveis e naturais deste mundo. E se for preciso volto ao
campo de batalha, mas só vou me ocupar com isso quando a guerra recomeçar, e SE
recomeçar. Nunca me “pré-ocupar”. Afinal, a tal recidiva poderá nunca acontecer
e terei - “pré-ocupando-me” por antecipação (perdoem o pleonasmo) -, azedado o que
me restaria de vida pra viver plenamente.
Os
efeitos colaterais são inevitáveis, porém perfeitamente suportáveis com o arsenal
de drogas hoje existentes para alivia-los. Se puder, dê uma olhada na seção 2
da guia QUIMIOTERAPIA, aí no cabeçalho do blog.
E,
Frida, não se isole; compartilhe. Divida o peso aceitando a ajuda de amigos e
parentes mais próximos, sinceramente interessados, com quem poderá falar
francamente do tratamento, seus efeitos, desabafar e chorar juntos, se for
preciso, escolher os melhores caminhos a seguir e vibrar com as vitórias
alcançadas.
E
depois de refletir bem e tomar sua decisão confie no tratamento e no médico
escolhidos. Eles serão os instrumentos de Deus. E, sobretudo, confie em você mesma,
no seu Eu Interior, na sua Centelha Divina.
Grande
Abraço em nome de todos os nossos amigos deste blog.
Ilustração do googleimages
Ilustração do googleimages
5 Comentários:
Daniel eu admiro muito o nível de entendimento e compreensão que você tem sobre o assunto.
O meu foi de mama, mas aqui no Sul é uma dificuldade enorme para vencer tabus e preconceitos quanto ao assunto. Chega a ser algo cansativo demais.
Abs!
Daniel você é uma pessoa muito especial, conseguiu enxergar a vida da maneira mais verdadeira como que deve ser.
Tenho muito orgulho de ter te encontrado nesse mundão de meu DEUS e poder usufruir um poquinho desse dom que tem e passa pra gente perante a vida.
Um forte abraço!
amigo querido, vc soube como ninguém descrever tudo que vivenciamos desde o diagnóstico, até o momento que, inevitavelmente, entramos na luta. Pra mim ela teve varios recomeços, mas só me pre-ocupei qdo ja esta certa o que seria, pois a vida não pode ser desperdiçada com pormenores. Obrigada por citar meu nome e por estar assim, tão presente em minha vida. Beijos em sua amada esposa...
Daniel... venho te agradecer por tanta atençao com que vem tratando e ajudando-me a entender as minhas duvidas e incertezas... para nao sobrecarregar seus comentarios com uma resposta muito grande...deixei no meu blog a resposta e meu agradecimento a vc...
Obrigada...muito mesmo por tudo...
Que Deus lhe proteja, lhe de saude e paz...
Vou ler e conversar com a medica dele a respeito...obrigada Daniel...
Deus o abençoe...
Postar um comentário