quarta-feira, 27 de julho de 2011

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Isla de Margarita II, “O Retorno”

Anitha (A DE ANITHA), minha querida amiga mineira, poeta madura, inspirada e talentosa (numa fase linda e docemente criativa), me deu um merecido puxãozinho de orelha em comentário recente aqui. É que, contrariamente ao que normalmente costumo fazer, me ausentei aqui do blog assim, na maior, sem avisar. Ela tem razão e aproveito para pedir-lhe desculpas e aos demais amigos que costumam participar, validando, cada um a sua maneira, este espaço. Mas, permitam-me atenuar um pouco minha culpa: quando viajei levei o laptop na mochila, como faço sempre nos meus deslocamentos de trabalho ou de laser. E pensava poder atualizar as postagens tipo hecho en Venezuela. Ledo engano.

Ficamos hospedados em Margarita numa dessas casas de veraneio pertencentes a uma minoria de pessoas abastadas que vivem em Caracas, dotada de todo o conforto necessário para se desfrutar de um período de férias, mas sem a comodidade de uma conexão à internet. E a julgar pelo que pudemos perceber em Margarita, a revolução demagógica de que tanto falam na mídia não chegou a produzir os efeitos benéficos proporcionados pela associação midiática da informática com a internet, que parece ainda não se ter tornado uma realidade disseminada entre a maioria das pessoas no cotidiano do País. E nada de centros comerciais dotados de rede wireless, nem nada de cybercafés. Fiquei ilhado.

Nem tanto quanto Cuba - um pais estagnado na década de 50 - a Venezuela parece ainda mergulhada até o pescoço naquela letargia cultural - onde se inclui a tecnologia que se desenvolve dialeticamente - que insiste em se eternizar na maioria das repúblicas aqui da América do Sul, em pleno século XXI. Imaginem, a primeira vez que estive lá, em 2006, eles ainda estavam experimentando a febre da chegada recente dos celulares entre eles. Nove, entre dez pessoas, andavam com a cara enfiada em um celular!

Nem no grandioso e elegante Shopping pertencente à rede nacional Sambil havia conexão disponível. Alias, como já destaquei no post anterior, a ilha é tax free, permitindo ao turista avisado encontrar marcas famosas como Ray-Ban, Victoria´s Secret, Liz Claiborne, Adidas, Nike, Nintendo, PSP’s,  BlackBerry, Diesel,  L’Occitane, Tommy Hilfiger,  Lacoste, Dolce & Vita, MNG, GSL, Timberland, Levi´s, Apple, eletroeletrônicos, perfumes importados, vestuário, acessórios para autos, entre uma infinidade de outros itens, a preços de verdadeira zona franca. Na Av. 4 de Mayo, nos Boulevards Guevara e Bolivar (os chamados “paraguais”), em Porlamar, ou nos seus outlets e nos Shoppings Centers Sambil (com destaque para a Joyeria botticelli) e La Vela.
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Como tem sido possível observar, e contra minha vontade, não tenho podido atualizar o blog com a frequencia diária com que costumava atualizar desde seu início. Isto, em consequência de uma conjunção de fatores impeditivos, alguns imprevistos, alheios a minha vontade. Mas creio que a partir da próxima semana as coisas poderão correr mais tranquilas e poderei retomar meu eixo. Até lá, vou fazendo o que for possível. Algumas fotos, abraço em todos e muita, muita saúde!

quinta-feira, 21 de julho de 2011

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A biela na Venezuela é mais embaixo

Carro revisado: suspensão, parte elétrica, óleo do Carter, filtros de ar, de combustível, de óleo lubrificante, pneus... . GPS com os mapas atualizados do Brasil e da Venezuela.  Passaportes, Certificado Internacional de Vacinação (que não foram pedidos na fronteira), papelada do DETRAN... . Preparativos para enfrentar os 4000 e poucos km através dos estados do Amazonas, Roraima e parte da Venezuela para ir até Isla de Margarita, no litoral caribenho, e voltar a Manaus.

Como já havia feito a viagem antes, em 2006, os mais de 300 (no total mais de 600, ida e volta) infernais km contínuos de buraqueira na rodovia brasileira BR-174 não chegaram a me surpreender totalmente: apenas mudaram de trecho. Mas acho que Sandrinha, Vera, minha irmã e Carlos, meu cunhado e amigo há várias décadas, ficaram meio que apavorados, no início. Mas reagiram bem.

Enquanto isso, já foram demitidos mais de uma dúzia de funcionários do Ministério dos Transportes e do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), incluindo o ex-ministro Alfredo Nascimento, ex-prefeito aqui de Manaus, por denúncias de superfaturamento e de pagamento de propina.

Mas, pra quem prefere as aventuras, a evasão da previsibilidade cômoda, chata e engessada dos chamados pacotes turísticos - mesmo sabendo das dificuldades a superar - o desafio era muito excitante. Afinal, Manaus é uma cidade ainda ilhada pela falta de ligação rodoviária com o resto do País. E esta viagem para o Caribe é uma tentação, a única chance de se pegar uma estrada, fazer a própria rota, escapulir da rotina, parar onde quiser, enfim, deixar os instintos nos guiarem, como na famosa série americana Rota 66, que os que já passaram dos 50 devem lembrar muito bem.

Em compensação, o tempo perdido na rodovia brasileira esburacada pode ser parcialmente recuperado nas excelentes estradas venezuelanas - que, no essencial, não devem nada às autopistas da Europa. O terror fica por conta das famigeradas Alcabalas, espécie de postos de controle da Guarda Nacional e do Exercito venezuelano espalhados às centenas ao longo da estrada, guarnecidas por ávidos soldados que criam problemas com os turistas brasileiros para pedir propina descaradamente.

(Uma maneira de se contribuir para acabar com isto é não ceder. Soube depois, conversando com um comerciante brasileiro em Margarita, que os empresários brasileiros locais têm pressionado junto ao Itamarati para tentar amenizar o problema. Acho muito difícil. A corrupção na América Latina é um mal tão arraigado que até parece mais biológico que moral).

A paisagem ao longo da viagem é deslumbrante aos olhos da sensibilidade pela natureza. Passa-se do domínio da Floresta Equatorial Úmida, caracterizada por mata densa e exuberante, para o domínio da Savana que recobre um relevo residual dissecado, de uma planura calma e sublime, onde despontam aqui e ali morros e serrotes, tudo coberto por uma vegetação rala e rasteira. A Gran Sabana está dentro do parque Nacional de Canaima, no sul da Venezuela, no estado de Bolívar. Constitui-se em uma das maiores atrações turísticas do país, com vistas que não se encontram em nenhuma outra parte do mundo.

Bem, se você conseguir superar a buraqueira brasileira e a corrupção venezuelana das estradas, terá que fazer ainda 2 horas de Ferry-boat expresso para chegar a esta ilha secular do mar do Caribe, uma Zona Franca com cerca de 420.000 habitantes, cercada de belas praias como El Agua, Saragoza, Paraiso, El Pargo... e de locais para lamber vitrine no paraíso consumista e enfiar o pé na jaca das compras: confecções, calçados, eletroeletrônicos, jóias e adornos femininos em pérolas cultivadas, coral, madrepérola... Tudo muito, muito barato!

(Além disso, a vantagem cambial. Em Pacaraima, cidade fronteiriça do Brasil, cada Real estava valendo 4,7 Bolívares, que é a moeda lá deles. A gasolina e o diesel custam centavos!).
A hospedagem, para se ter uma idéia, em um chalé maneiro, todo mobiliado, em um condomínio residencial elegante em plena Playa El Agua, o Tejas Rojas, ficou em torno de R$ 75,00 a diaria por casal.

Durante essa breve estadia de uma semana (havia programado pelo menos 10 dias, mas meu cunhado revelou que tinha compromissos inadiáveis de trabalho) pude vivenciar pela televisão, pelo rádio (sim, eu ouço rádio), pelos jornais e pelo movimento nas ruas um pouco da realidade social daquele povo simples, hospitaleiro e crédulo em sua grande maioria, em plena comemoração de sua maior data nacional, a da declaração de sua independência da Espanha, em 5 de julho de 1811.

É impressionante o anacronismo da demagogia, da arrogância, do ufanismo e do nacionalismo “revolucionário” extremado que encharcam os discursos oficiais, repletos de exaltação ao heroísmo histórico do povo e de Simon Bolivar, “O Libertador”, e de excitação histérica e puxa-saquista a Hugo Chavez, El Comandante Supremo Revolucionário. Algo patético, meio quixotesco, mas também perigoso como a História já muito bem o demonstrou. Quem não lembra do Nacional-Socialismo de Hitler e de Mussolini?

Chavez tem atuado a nível continental como se fosse um grande líder político regional, liderança que só ele consegue enxergar. Mas, reparem neste desenho comemorativo do bicentenário da independência venezuelana, que talvez encerre em sua simbologia (a Venezuela montada sobre um cavalo que é a América do Sul) algo muito mais preocupante que a simples pretensão de liderança política.

E nesta minha segunda viagem a Margarita, continuo com a impressão frustrante de ter saído correndo de lá, como foi da primeira vez. E isso, pra mim - que tenho correndo no sangue talvez um pouco daquele betume escaldante do asfalto das estradas - é mais que um simples pretexto pra voltar o mais breve possível e explorar o melhor que a Ilha tem a oferecer, além de usá-la como plataforma para ir explorar os ritmos calientes de Cuba e a diversidade cultural das ilhas holandesas de Aruba e Curaçao.

É só o tempo do carro sair da oficina e de dar uma refrescada na biela!